Observatório-Geral da República: o cidadão teme o futuro, o político o passado
Excelente texto que nos trás uma boa reflexão sobre a situação patética política do nosso país.
disponível em: http://professorlfg.jusbrasil.com.br/artigos/
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1) Cada brasileiro arcou com 0,10 centavos para o magnata Cunha - Quase 60 mil dólares a primeira-dama da Câmara dos Deputados (jornalista Cláudia Cruz) pagou para uma das academias de tênis mais famosas da Flórida (a de Nick Bolletieri). Para o Malvern College, da Inglaterra, foram 8,4 mil dólares (Folha 10/10/15: A1). Em sua conta Kopek, n. 457.8512, no banco Julius Bär, na Suíça, entraram mais de 1 milhão de dólares (Folha 11/11/15: A2). No contexto mundial de bilhões ou trilhões de dólares desviados anualmente, os pagamentos da madame não passam de um pingo d’água no oceano. Mas isso é só a ponta do iceberg. Nas quatro contas do magnata presidente da Câmara transitaram mais de 23 milhões de reais. Isso significa que ele se apropriou indevidamente de R$ 0,10 de cada brasileiro. De grão em grão a galinha enche o papo! Cunha é um dos milhares de poderosos que espalham o vírus da corrupção pelo país. Se não forem punidos, a peste nunca será controlada (como o é em vários países – veja o ranking da Transparência Internacional).
2) “Follow the maney” e descubra o quanto o mundo financeiro lava mais branco – É só “seguir a movimentação do dinheiro” e tudo vai se esclarecendo. As quatro contas clandestinas de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) descobertas até aqui circularam por 23 contas bancárias em Cingapura, Suíça, Estados Unidos e Benin. Trata-se de um dos expedientes mais usados para ocultar a origem do dinheiro (e de tentar evitar que ele seja descoberto). O que o ladrão em geral mais teme é seu empobrecimento “Se disserem que o crime não compensa, você tem que lembrar que é porque quando compensa, não é crime” – Millôr Fernandes, brasileiro, escritor). Um tempo na cadeia ele até suporta (“A morte nos ensina a transitoriedade de todas as coisas” – Leo Buscaglia, americano, escritor). Perder sua riqueza ilícita (assim como boa parte da lícita, quando a tem) é o que causa maior constrangimento e preocupação.
3) O Brasil não está “quebrado” por acaso - O dinheiro encontrado nas contas secretas de Eduardo Cunha é fruto espúrio e incestuoso de apenas uma das milhares transações feitas pela Petrobrás nos últimos anos (compra da exploração de um campo de petróleo em Benin, África). Somente nesse “negocinho” o empresário Idalécio de Oliveira recebeu 31 milhões de dólares, entregando 10 milhões de dólares a um lobista (João Augusto R. Henriques), que repassou 1,3 milhões de francos suíços para Cunha. Não se quebra uma Petrobras nem um país gigante (7ª economia do mundo, candidatando-se para ser a 9ª) da noite para o dia, numa única negociata. De qualquer modo, parece muito certo que o Brasil não está “quebrado” (mais uma vez) por acaso. O vírus da corrupção (peste interminável, mas controlável) encontra terreno muito fértil justamente em modelos de Estado como o brasileiro que é pesado, burocrático, conservador, autoritário, populista, com valores ultrapassados, clientelista, fisiologista, patrimonialista (S. Schwartzman, Bases do autoritarismo brasileiro).
4) “Não se faz um país subdesenvolvido da noite para o dia” (Darcy Ribeiro) -Alguns setores da sociedade civil brasileira pregam ideias liberais (Estado mínimo na economia, ágil e enxuto); as correntes menos ortodoxas chegam a admitir que ele também promova ações em favor dos mais vulneráveis. Tudo que essas elites econômicas e financeiras ensinam é que devemos estar longe desse Estado inchado, ineficiente, neopatrimonialista e clientelista. O discurso é coerente com uma forma liberal de pensar. O problema é que, na prática, várias elites endinheiradas não resistem ao canto da sereia e prontamente correm para as tetas (receitas orçamentárias) dos governos. Os bem posicionados dentro do Estado brasileiro(particularmente nos setores da construção, bebidas, bancário, agronegócio, minerais, alimentos etc.), por meios lícitos ou escusos, sempre construíram um emaranhado de interesses recíprocos, alguns pornograficamente criminosos, que manobra quantias incalculáveis de dinheiro público anualmente. Os escândalos da Petrobras, Metrô de São Paulo etc. Possuem esse mesmo DNA: são crimes organizados P8: Parcerias Público-Privadas entre Poderosos para a Pilhagem do Patrimônio e do Poder Públicos.
5) Da República Velha à República Velhaca. A República Velha (1889-1930) teve catorze presidentes e uma Junta Governativa (Deodoro da Fonseca, Floriano Peixoto, Prudente de Morais, Campos Sales, Rodrigues Alves, Affonso Penna, Nilo Peçanha, Hermes Fonseca, Wenceslau Bras, Delfim Moreira, Epitácio Pessoa, Arthur Bernardes, Washington Luís, Júlio Prestes e uma Junta composta de José Linhares, Augusto Fragoso, Isaías de Noronha e Menna Barreto). Começou com um golpe militar e terminou com outro golpe de Getúlio Vargas (em 1930). Foi um desastre para o País, visto que combinou o lado extrativista e usurpador (muitas vezes abertamente criminoso) de alguns atores econômicos (supostamente liberais) com o formato do histórico Estado brasileiro que é patrimonialista, burocrático, ineficiente, inchado, autoritário, populista, clientelista etc. (S. Schwartzman). A Nova República (período de redemocratização de 1985 a 2015), com algumas peculiaridades e nuances (e empioramentos), segue a mesma matriz organizacional (e corruptiva) da República Velha. Converteu-se, assim, numa República Velhaca, regida pela desonestidade, que é “o abandono da vantagem permanente por uma vantagem temporária” (Christian Bovée, americado, escritor).
6) O cidadão tem medo do futuro; o político, do passado. Tanto a República Velha como a República Velhaca nunca compreenderam que, quando queremos a construção de uma nação próspera e sustentável, “Não vale a pena comprar aqueles que se vendem” (François Andrieux, francês, escritor). A emenda constitucional da reeleição de FHC foi “comprada”; no mensalão do PT o governo Lula “comprou” parlamentares para garantir a governabilidade. A corrupção constitui um dos eixos da Nova República. Daí a etiquetagem de República Velhaca, onde “Os cidadãos têm medo do futuro e os políticos têm medo do passado” (Chico Anísio, brasileiro, humorista). É chegado o momento de uma Terceira Via, que coloque o Estado no seu devido lugar assim como estimule a construção de uma sociedade civil que seja liberal sem ser exclusivamente privatista.
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